domingo, 4 de março de 2012

TEXTO PARA AULA DE VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS 1º ANO

O falar maranhense na prática
O analista de sistemas maranhense Armando Henrique de Jesus resolveu, em um momento de ócio, escrever uma pequena história fictícia utilizando o máximo de expressões típicas da região que marcaram sua infância. O texto não demorou a se espalhar pela internet e é reproduzido aqui com autorização do autor:
Um dia na vida de Reginete 
Por Armando Henrique ("Piruca")
Reginete, a empregada da casa do Vieira, chega da Rua Grande toda querendo ser, de traca amarela, umajaponesa bandeirosa com pontuação 2 números acima da sua, rebolando e exibindo sua calça nova, daquelas bem apertadas e lá no rendengue, que comprou para sair à noite. Logo gerou um bafafá das invejosas de plantão.
- Olha a barata do Vieira. Quer se aparecer! Tá escritinha uma fulêra!
E tu parece uma nigrinha dando conta da vida dos outros - retruca à mulher Seu Barriga, que estava só coíradescansando em um pequeno mocho na porta de casa.
Porém, despertou também o interesse de toda a curriola da rua. A galera do chucho parou para secar a moça. Até quem tava no desafiado.
Guga largou de empinar seu papagaio aos gritos de "lá vaiii lá vaiii...", batendo tala, mas sempre na guina paralancear melhor e com uma bimbarra do freio reforçada e linha puída pelos amigos que o sabotavam pisando disfarçadamente, para admirar:
- Éguass Reginete! Tá pintosa como quê!
- Hmmmm piqueno. O que é heim? Só porque tô com minha calça nova? Comprei na Lobrás ontem tá?!
Victor, garoto que vivia cheio de curubas nas mãos por causa de suas carambelas no asfalto, desinformado, questiona:
- O que é Lobrás?
- É uma loja, abestado. Ao pegado da Mesbla. Defronte as Pernambucanas. Onde a gente vai sempre caparbombom - corta Guga.
Nesse momento, Caverna, o mais delegado das peladas, largou sua curica, feita de talo de coqueiro e folha de caderno, e veio, catingando que só ele, arrumar cascaria com Guga.
- O quê que tu quer?! A nêga é minha.
- Hmmmm tu quer te amostrar pros teus pariceiro? Te dôle um bogue!!!
- Me dáli??? Rapá, tu não me trisca!!!
E a galera vem zilada jogar lenha na fogueira.
- Éééésseeeeee!!! Tá falando da tua mãe!!! Chamou de qualhira!
- Ééélasss... eu não deixava!!! Cospe aqui - diz Dudu, que só andava na calha, estendendo a mão.
Mas Guga não entra na conversa dos amigos:
- Rapá, negada só querem ver a caveira dos outros! 
- Ihhh gelão... cagou ralo heim Guga!!! Tá aberando!!! 
Até que chega Lombo, o mais velho da turma, que jogava peteca naquele momento. Ele tinha o costume de quebrar as petecas alheias na brincadeira do cai, dando um china-pau com seu cocão de aço, principalmente se fosse numaolho de gato. Utilizava, também, o recurso do olhinho, mas dificilmente só bilava. Pediu limpo, completoumatança nas borrocas e depois foi pro casa ou bola. Às vezes porco ou leitão visitando. Ele intervém gaguejando: 
- Ê Caaaa-Caverna, tu tu tu já tá coisando os outros aí né?! Vai já levar um sambacu!
- Hen heim. Vamo já te dar um malha - confirma Guga, aliviado com a intervenção de Lombo.
- Hen heim - retruca Caverna imitando Guga com voz afeminada. 
- Não me arremeda não!!! Olha o raspa!!!
- Ahhh... te lascar!!! 
Depois do furdunço por sua causa, Reginete sai toda empolgada de lá e decide dar logo uma parada na quitanda da Zefinha, lembrando que seu Vieira havia pedido que ela comprasse alguns ingredientes para garantir o fim de semana, já que Dona Veridiana ainda não havia feito a Lusitana do mês.
- Oi Dona Zefa. Quero camarão seco pra botar na juçara da dona Veridiana e fazer arroz de cuxá. Me veja 3Jeneves também, 2 quilos de macaxeira, um lidileite alimba, 2 pães massa fina e 4 massa grossa! Ahh... e umacanihouse pra eu fazer a base pra noite!
A senhora vai checar seu estoque no freezer e retorna:
- Ê essa outra... só tem Jesus. Vais querer? Vais querer quantas mãozadas de camarão?
- Três tá bom. E pode ser Jesus sim.
Ao chegar em casa com as compras, seu Vieira repreende a moça: 
- Tu fica remancheando pra trazer o cumê. To urrando de fome aqui já! Cuida piquena!! Vou só banhar e quando voltar quero ver tudo pronto.
- Ô seu Vieira... o senhor é muito desinsufrido! Já to arreliada com uma confusão dos meninos na rua. Não meaguneia! Confie ni mim que faço tudo vuada! O senhor sabe que...
- Já seiii... tá bom... aí fala mais que a nêga do leite. Eu heim?! - seu Vieira interrompe.
Neste momento chega Marquinho, filho do seu Vieira, com a equipagem da Bolívia Querida toda suja. Sinal de mais trabalho pra Reginete.
- Menino, olha essa tua roupa. Tava num chiqueiro era? Vai ficar encardidinha! Isso não sai não! E esses brinquedos?! Tudo esbandalhado! Aí não tem jeito! Olha... tá só o cieiro (ou ceroto, como queiram)!
- Tava jogando travinha com os moleques! Não enche e me dá logo esse refri aí que to com sede. 
- Hum Hum. Isso é do seu Vieira!
- Marrapá! Por quê?! Deixa de canhenguice, piquena!
- Deixa eu cuidar comigo que ainda quero sair hoje pra radiola no clubão! Vai rolar só pedra!
Passada a janta, Reginete já exausta lava a louça e reflete sobre seu evento da noite: "Já estou é aziada e as meninas não ligam. Amanhã começa mais um dia de trabalho e se sair hoje ainda fico lisa pro fim de semana!". A moça muda de idéia segue sua rotina. Todos os preparativos para a noite foram em vão? Nãããã! O importante foi chamar a atenção e não se achar mais uma no meio da multidão!

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